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1 de jul. de 2009

Amei este texto!!!!!

Culpa

Por detrás de nossas tristezas e frustrações, detrás da nossa insatisfação na vida, de nossos tédios e angústias está um sentimento. O mais arraigado em nosso comportamento e responsável por grandes sofrimentos psicológicos. Que é o sentimento de CULPA.
O sentimento de culpa é um apego ao passado, é o arrependimento de alguém não ter sido como deveria ter sido. É uma tristeza por ter cometido algum erro que não deveria ter cometido. O núcleo do sentimento de culpa são estas palavras: “Não deveria”.

A culpa é a frustração entre a distância do que nós fomos e a imagem do que nós deveríamos ter sido. Nela consiste a base da autotortura.

É como se dentro de nós se processasse um julgamento em que o eu ideal, imaginário é o juiz, e o eu real, humano é o réu. E como nosso pensamento nos exige algo impossível, nosso eu real nunca poderá atendê-lo. Este é um ponto fundamental.

Na culpa nos dividimos em duas pessoas: Uma real, errada, má e ruim. A outra ideal, boa e certa. E que tortura a outra.

É como se dentro de nós processasse um julgamento em que o eu ideal, imaginário é o juiz, e o eu real, concreto, humano é o réu. O eu ideal sempre trás exigências impossíveis e perfeccionista. Assim, quando estamos atormentados pelo perfeccionismo, estamos absolutamente sem saída. E como nosso pensamento nos exige algo impossível. Nunca o nosso eu real poderá atende-lo. Este é um ponto fundamental.

Muitas pessoas dedicam sua vida a tentar a concepção do que elas devem ser ao invés de se realizarem por si mesmas. A diferença entre a auto-realização e a realização da imagem é muito grande. A maioria das pessoas vive apenas em função da imagem ideal e este é um instrumento fenomenal para se fazer o jogo do neurótico. A autotortura, o auto-aborrecimento, o auto-castigo a auto-punição. A culpa.

Quanto maior for a expectativa a nosso respeito, quanto maior for o modelo perfeccionista de como deve ser a nossa vida, maior será o nosso sentimento e culpa.

A culpa é também a tristeza de não sermos perfeitos. É a tristeza de não sermos Deus. Por não sermos infalíveis. É um profundo sentimento de orgulho e onipotência. É uma incapacidade de lidar com o erro, com a imperfeição. É um desejo frustrado. É o contato direto com a realidade humana em contraste com as sua imperfeições perfeccionista, com seus pensamentos megalomaníacos a respeito de si mesmo.

O mais grave é que aprendemos o sentimento de culpa como virtude.

A culpa sempre se esconde atrás da máscara do aperfeiçoamento como garantia de mudança. Mas nunca dá certo.

Os erros dos quais nos culpamos são aqueles que menos corrigimos. A lista dos nossos pecados no confessionário é sempre a mesma.

A culpa longe de nos proporcionar incentivo ao crescimento, faz-nos gastar energias numa lamentação interior por aquilo que já ocorreu, ao invés de gastarmos em novas coisas, novas ações e novos comportamentos.

Por isso mesmo, em todas as linhas terapêuticas, este é um sentimento considerado doentio. Não existe linha de tratamento psicológico que não esteja interessada em tirar dos seus pacientes o sentimento de culpa.

A culpa é a vingança de nós mesmos por não termos atendido a expectativa de alguém a nosso respeito. Seja esta expectativa clara e explícita, ou seja, uma expectativa interiorizada no decorrer de nossa existência.

Por isso é que se diz que ao nos sentirmos culpados, estamos alienados de nós mesmos e a nossa recriminação interna vem, nem mais nem menos, das vozes do passado, ainda recriminatória de nossos pais, mães, mestres ou outras pessoas que ainda cultuamos. Mas aquilo que nos leva a este sentimento de culpa, aquilo que alimenta esta nossa doença auto-destrutiva são algumas crenças falsas.

Trabalhar o sentimento de culpa é primordialmente descobrir as convicções falsas que existem em nós. Aquelas verdades que cremos, que sendo errôneas, nos levam a culpa.

A primeira delas é a crença na possibilidade da perfeição. Quem acredita que é possível ser perfeito viverá necessariamente atormentado pelo sentimento de culpa.

A expectativa de vida é um produto de nossa fantasia. Quanto maior a discrepância entre a realidade objetiva e a nossa fantasia, tanto maior será nosso esforço na vida e maior a nossa frustração.

Respondendo à esta crença opressora da perfeição, atuamos num papel que não tem fundamento real nas nossas necessidades. Nós nos tornamos falsos, evitamos encarar de frente, as nossas limitações e desempenhamos papéis sem base em nossa capacidade. Criamos um terrível inimigo dentro de nós, que é o ideal imaginário.

Respondendo ao ideal de perfeição nós desenvolvemos uma fachada falsa para manipular e impressionar os outros. É muito comum no relacionamento conjugal, marido e mulher não estarem se amando um ao outro e sim a imagem de perfeição que cada um fez do outro. É claro que nenhum dos parceiros consegue corresponder a esta expectativa irreal.

A resposta a isto é a frustração mútua de não encontrar a perfeição esperada, gerando tensões e hostilidades em um longo jogo de culpa.

Esta situação se aplica a todas as relações onde pessoas acreditam que amar o outro é ser perfeito.

Embora, as pessoas acreditem que errar é humano, elas simplesmente parecem não acreditar que são humanas.

Embora, digam que a perfeição não existe, continuam a se torturar, a se punir e punir aos outros por não corresponderem a um ideal perfeccionista do qual não querem abrir mão.

Outra crença que nos leva a culpa, esta talvez mais sutil, mais encoberta e profunda em nossa vida, é acreditarmos em que há uma relação necessária de erro e culpa. A vinculação automática entre erro e culpa.

Quase todas as pessoas a quem tenho perguntado de onde vem o sentimento de culpa me respondem taxativamente que vem dos seus erros.

Acreditamos que a culpa é uma decorrência natural do erro, que não pode de maneira alguma haver erro sem culpa. Se acreditarmos nisso estamos num problema insolúvel. Ou vamos passar a vida inteira tentando não errar para não sentirmos culpa. E isto é impossível porque sempre haverão erros em nossa vida. Ou então passaremos a vida inteira nos sentindo culpados porque sempre erramos. Esta vinculação causal entre erro e culpa é profundamente falsa.

A culpa não decorre do erro, mas da maneira como nos colocamos diante do erro. Vem do nosso conceito relativo ao erro. Vem da nossa raiva por termos errado.

Uma coisa é o erro, outra coisa é a culpa. Erros são erros e culpa é culpa. São duas coisas distintas, separadas, em que nós unimos de má fé a fim de não deixarmos saída ao nosso sentimento de culpa.

O erro é o modo diferente, fora de algum padrão. O que é chamado erro é a saída fora de um modelo determinado que pode ser errado hoje e não amanhã, pode ser errado em um país e não em outro.

A culpa é um sentimento. Vem de nós, vem da crença que errar é errar, que não podemos errar, que devemos ser castigados pelas faltas cometidas.

Crença que cada erro deve corresponder necessariamente a um castigo. De que cada falta deve corresponder a uma punição. Aliás, o sentimento de culpa é o castigo que damos a nós mesmos por termos errado.


Não é possível não errar. O erro é inerente a natureza humana. Ele é necessário a nossa vida. Na perfeição humana está incluída a imperfeição. Só crescemos através do erro.

As pessoas confundem assumir o erro com sentir culpa. Assumir o erro é aceitar que erramos e nos responsabilizamos pelo que fizemos ou deixamos de fazer.

Mas, quando acreditamos que a culpa decorre do nosso erro, tentamos imputar a outros a responsabilidade dos nossos erros numa tentativa infrutífera de acabarmos com nossa culpa.


O perfeccionismo é a morte lenta;

Há um texto de Hugh Preter, que diz.

“ se tudo ocorresse perfeitamente como eu planejara, jamais experimentaria algo novo. Minha vida seria uma repetição infinda de sucessos já vividos. Quando cometo um erro, vivo algo inesperado. Algumas vezes reajo como se tivesse traído a mim mesmo. O medo de cometer erros parece fundamentar-se na recôndita presunção de que sou perfeito e que se for muito cuidadoso, não perderei o céu.
Contudo, o erro é a demonstração do que sou. É um solavanco no caminho que tracei, um lembrete de que não comando os fatos. Quando der ouvidos aos meus erros, ao invés de lamentar, terei crescido”

Este é o texto.

O perfeccionismo é uma maldição, é uma prisão. Quanto mais você treme, mais erra o alvo.
Não tenha medo de erro. Erro é um jeito de fazer algo diferente, talvez criativamente novo.

Algumas pessoas me perguntam como avançar em relação a este sentimento. Como arrancar de mim este hábito de me deprimir com os erros cometidos.

Existe uma saída para o sentimento de culpa. Façamos uma fantasia:


Imaginemos por um instante que estamos a morte. E nosso sentimento, neste momento, é de angústia, tristeza e frustração por todos os erros cometidos, por tudo que deveríamos ter feito e não fizemos. Remorsos pelos fracassos, como pai, como mãe, como profissional, como marido ou esposa, como religioso ou cidadão. Mas, ao mesmo tempo estamos com um profundo desejo de morrer em paz, de sair deste processo íntimo de angústia e morrer tranqüilos.

Qual a única palavra que se pronunciada neste momento e sentida com todo o coração teria o poder de transformar a nossa dor em alegria, o nosso conflito em harmonia, nossa tristeza em felicidade?

Somente uma palavra teria esta magia: PERDÃO.

O perdão é uma palavra perdida em nossa vida. O primeiro sentimento que se perde no caminho da loucura é o perdão. O sentimento de autoperdão.

Se a culpa é a vergonha da queda, o autoperdão é o elo entre a queda e o levantar. O perdão é o recomeço da brincadeira depois do tombo. O perdão é sempre a si mesmo. O perdão ao próximo é um modo de dizermos que já nos perdoamos. O autoperdão é a paciência diante da escravidão, é o vislumbre da aurora no final da noite.

O autoperdão é dizer adeus a um passado é restabelecer nossa unidade que a culpa havia dividido.

O perdão é a aceitação da vida como ela é. A criança faz isto muito bem.

Não fique aborrecido com seus erros. Alegre-se por eles.
Você teve a capacidade de dar algo de si.


14 de maio de 1989
jorge Reigada